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quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Crédito consignado acumula contenciosos


Autor(es): Caio Junqueira | De Brasília - 08/08/2012

O crédito consignado despontou no país junto com o escândalo do mensalão, sendo inclusive acusado de integrar o esquema de repasse de recursos públicos a parlamentares em troca de apoio nas votações. Mas sete anos depois, no momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) julga o caso, parte dos envolvidos neste modelo de financiamento bancário mediante desconto na folha de pagamento diversificou as formas de fraudes e irregularidades.
Hoje, elas ocorrem em várias frentes. São cobrança de taxas maiores que a do contrato assinado; descontos não autorizados; liquidação do empréstimo sem exclusão do desconto e ausência de recebimento do valor, embora o contracheque apresente o desconto. Essas práticas levaram o Ministério Público federal e estaduais a agir em muitos casos. No Congresso e em algumas Assembleias proliferaram projetos de lei para regular esse mercado.
Na Câmara, há pelo menos 13 propostas em tramitação. Sugerem teto para o desconto no salário, veto à contratação por meio de procuração, veto a novo contrato de consignado enquanto houver outro em andamento, limite à taxa de juros, autorização de familiar nas operações de consignado com idosos ou exigir firma reconhecida para contratação para esse grupo e impedir a contratação à domicílio. O foco principal são os chamados "pastinhas", intermediários entre bancos e contratantes que costumam, com ou sem anuência da instituição, manipular os contratados -principalmente aposentados - para extorqui-los. A Previdência estima em R$ 10 milhões de empréstimo contratados em benefícios previdenciários.
É o que explica as fraudes terem se tornado uma bandeira para alguns políticos. O deputado federal Marllos Sampaio (PMDB-PI) encabeça os movimentos na Câmara. Articulou a realização de duas audiências públicas este ano para discutir o assunto. Só não saiu candidato a prefeito de Teresina (PI) devido à aliança de seu partido com o PTB. É o vice de Elmano Férrer, candidato a reeleição.
Em Fortaleza (CE), o deputado estadual Heitor Férrer (PDT) está em terceiro nas pesquisas, após ter denunciado e explorado na tribuna da Assembleia possíveis fraudes na lei do crédito consignado encaminhada pelo governo do Estado. As informações geraram investigação do Ministério Público, que apura a acusação de cobrança de juros acima dos praticados pelo mercado e a contratação de uma empresa do genro do secretário da Casa Civil para gerenciar as operações. O governo acabou recuando. Cancelou o contrato suspeito e revê a taxa de juros.
As polêmicas atuais sobre consignados também abrange a concorrência, leal ou desleal, de bancos grandes contra os médios. O principal alvo é o Banco do Brasil, que passou a dominar o mercado após o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva incentivar o crédito como medida anticíclica à crise financeira em 2008. Até então, eram os bancos médios, como BMG, Bonsucesso, Cruzeiro do Sul, Panamericano, Rural, e que dominavam esse mercado.
Mas a crise os prejudicou de forma generalizada. Foi preciso, então, que Lula utilizasse bancos oficiais para amenizar a crise. Só que o BB chegou com muita fome e, para os bancos médios, avançou o sinal: passou a fechar contratos de exclusividade com Estados e prefeituras para vincular o controle da folha de pagamento à concessão do consignado.
Os dados mais recentes apontam que servidores de cinco Estados e cerca de 40 cidades estão impedidos de buscar outras condições de financiamento em outros bancos. Isso a despeito de duas intervenções já ocorridas por órgãos do Estado. Uma delas foi a circular do Banco Central 3.522 de 2011, que proibiu a exclusividade nos contratos entre bancos e Estados e municípios. Outra foi a decisão do Cade de determinar a suspensão imediata de contratos que apresentassem esse modelo.
Ambas as decisões foram motivadas por representação da Federação Interestadual dos Servidores Públicos Municipais e Estaduais dos Estados do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Paraná, Piauí, Roraima, Sergipe e Tocantins na Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Arguíram o caráter anticoncorrencial desses contratos.
O BB não comentou o assunto. Sua estratégia, contudo, revolucionou o mercado de consignado. Em 2005, sua carteira nesta área era de R$ 3,8 bilhões. Em 2011 fechou em R$ 51,2 bilhões. O BMG, por exemplo, um dos primeiros a entrar nesse mercado em 2004, fechou no ano passado em R$ 6,4 bilhões. Outros bancos privados passaram a superar os médios. O Itaú-Unibanco fechou 2011 com carteira de R$ 8,8 bilhões.
O que revolta os bancos médios é justamente essa perda de espaço com estratégias questionáveis em um mercado outrora por eles controlado. Foi no final dos anos 90 que os primeiros prefeitos e governadores apostaram no modelo de crédito consignado para seus funcionários - do que se constata que muito antes do mensalão o consignado já caminhava ao lado da política. À época, com a memória inflacionária ainda muito viva, eram eles que se dispunham, sem cláusulas de exclusividade, a fazer esse tipo de financiamento aos servidores.
É por esse motivo que quando Lula, em 2003, decidiu permitir que o setor privado também tivesse acesso ao produto, os primeiros a operar nessa área foram os bancos médios, que traziam consigo experiências anteriores. Isso ajuda a entender porque foram eles os primeiros a obter autorização do governo Lula para atuar. Por outro lado, foi o que acabou os levando ao mensalão.
Segundo o relatório da CPI dos Correios, em 17 de fevereiro de 2003 o PT tomou empréstimo sem garantias do BMG no valor de R$ 2,4 milhões, avalizado pelo publicitário Marcos Valério de Souza. Na sequência, diz o relatório, o banco foi beneficiado na negociação da carteira de crédito consignado com a Caixa Econômica Federal. Segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), foi constatada que "as aquisições de carteiras de crédito consignado-INSS examinadas propiciaram um favorecimento do BMG, em afronta aos princípios da moralidade e da impessoalidade, que deveriam nortear a atuação dos gestores da Caixa". O STF, porém, avaliou que, como não havia envolvimento de réus com prerrogativa de foro nesse episódio, o melhor seria a remessa dessa parte do processo à justiça mineira. A assessoria do banco informou que o BMG foi pioneiro no consignado devido a juros mais atraentes e que era à época líder no mercado neste segmento. Sobre o processo do mensalão, afirmou que não se trata de desmembramento porque os diretores do banco jamais foram réus no STF. Respondem ao processo em Minas em razão dos empréstimos concedidos ao PT e às empresas de Valério
O Rural não teve a mesma sorte. Embora também seja apontado como beneficiado pelo governo no que se refere à autorização para atuar no crédito consignado, o que o coloca no julgamento são os empréstimos ao PT e a autoridades com prerrogativa de foro nele envolvidos. O advogado da ex-presidente Kátia Rabello falou ontem. A maior expectativa é a fala de Márcio Thomaz Bastos, advogado do ex-vice-presidente do banco, José Salgado.
Fonte: Valor Econômico

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